O Ano Novo
judaico
Vez por
outras passamos na frente de uma loja e encontramos a placa com os dizeres
“fechado para balanço”. O balanço é fundamental para a saúde de um negócio:
somente com ele é que o proprietário sabe como está indo seu investimento, se
está percorrendo o caminho certo e obtendo lucro, onde estão as falhas a serem
corrigidas, averigua exatamente o que tem em seu estoque e, acima de tudo,
somente fechando-se para balanço pode se programar para o futuro. No judaísmo,
existe um período em que também somos compelidos a nos fechar para um balanço
espiritual: é o que chamamos de Grandes Festas, a comemoração do Ano Novo
judaico.
Mas
como assim um ano novo no “meio” do ano? Os judeus se guiam por dois
calendários, o civil – o comum de todo dia -
e o religioso. Enquanto o calendário civil é apenas solar, o judaico é
determinado pelo sol e pela lua. Nele, um ano tem duração de 354 dias. É
exatamente por isso que o Ano Novo “cai” em datas distintas a cada ano, de
acordo com o calendário civil. Neste ano, as comemorações se iniciam nos dias
25 e 26 de setembro.
Durante
os dois primeiros dias é celebrado o Rosh Hashaná (literalmente “cabeça do
ano”). É o momento que, segundo a tradição judaica, o mundo completa
aniversário. Para os judeus, este é sexto dia do Gênesis, data que marca a
criação do homem, ápice da obra Divina e Seu objetivo maior. É um momento de
reflexão, introspecção e, acima de tudo, renovação. É o homem em busca do
sentido do ser humano. Nestes dias, reunimo-nos nas sinagogas ao redor do mundo
para um balanço do ano que passou, sobretudo procurando falhas e analisando o
que de realmente valioso carregamos em nossos “estoques” espirituais.
Justamente por isso que é costume pedir “desculpas” a quem porventura tenhamos
ofendido, pois com isso almejamos que o Todo Poderoso nos inscreva no Livro da
Vida para um ano bom e doce. O ponto alto das celebrações é o toque do Shofar –
o chifre de carneiro – antigo instrumento musical que, dentre tantas outras
utilidades, também era usado para a convocação de guerras. Neste instante, o
judeu é convocado a guerrear contra seu ego e contra tudo de ruim que possa ter
feito. Mas o judeu não reza apenas por si. Como é o aniversário do mundo, as
orações são feitas em prol de toda a humanidade.
Mas a
“guerra” contra o ego não pode se restringir apenas a orações e pedidos de
desculpas. Afinal, pedir perdão é muito fácil. Por isso os dias seguintes são
marcados pela penitência e arrependimento.
O ano novo não pode ser apenas uma virada de folha no calendário e sim
uma completa mudança de postura. Somos “inscritos” no Livro da Vida nos dois primeiros
dias, mas Deus espera mais de nós e nos dá até o décimo dia das comemorações
para “confirmar” nosso mérito. É neste décimo dia (4 de outubro) que celebramos
a data magna de nosso calendário, o Iom Kipur – o Dia do Perdão.
Durante
as 25 horas de comemorações, os judeus têm o costume de se abster de qualquer
tipo de prazer mundano. Não comem e nem bebem durante o dia todo e deixam de
calçar sapatos de couro, artefato que, no passado, era a distinção entre ricos
e pobres (somente os ricos andavam calçados). Neste dia, abrem mão também de qualquer
tipo de embelezamento e passam praticamente o dia todo em orações. O jejum
completo e as demais restrições têm um caráter essencialmente pedagógico: como
poderá o judeu pedir pelos menos favorecidos sem sentir “na pele” o que é ter
fome e privações? Além disso, relembra-nos que, como seres humanos e de acordo
com as palavras das orações, somos como “um vento que se dissipa” e que nossa
existência mundana é muito rápida para deixarmos de fazer algo de bom por outro
ser humano. Dinheiro, poder, luxo... tudo passa. A única coisa que realmente
levamos deste mundo são os bons atos que praticamos e a melhor herança que
podemos deixar são nossos exemplos.
O novo
ano judaico de 5775 (a contagem desde a criação de Adão, segundo a tradição)
traz a mensagem de que, apesar das diferenças, temos todos um único Pai que
incondicionalmente nos ama e que simplesmente espera que sejamos seres humanos
melhores a cada dia. E que, sobretudo, o que nos une é muito mais forte do que
o que nos separa.
Leshaná
Tová Tikatêvu veTechatêmu, em hebraico, que todos sejamos inscritos e
confirmados para um ano bom e doce. E um agradecimento todo especial em nome da
comunidade judaica à Paulínia que tão bem acolhe nos acolhe. Shalom!
Sami Goldstein ( na foto tocando Shofar)- é Rabino e Diretor do
Departamento Executivo da Secretaria de Finanças e Administração de Paulínia.
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